quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Martelando aquela coisa impossível

Aconteceu em um esbarrar de olhares pelo corredor do Departamento. De olhares mesmo - as pessoas evitam choques físicos, por mais sadios que eles venham a ser, claro.
Bom, olhá-la é inevitável - todos o fizeram, suponho. Não por ela ser bonita, nem pelo contrário. Uma ruiva verdadeira é sempre atingida por qualquer olhar, da malícia à admiração - inda mais nessa terra de misturas, onde a homogeneidade é exótica. Enfim, sempre a olho, não nego, por mais incômodo e exagerado que seja. Inevitável. Qual um magnetismo visual; chega a cansar. Eu cansei.
Noutra noite, fugindo de gente e de seus barulhos, sentei-me no outro bloco do Departamento. Pus-me a ler Kundera, empréstimo de uma grande amiga. Havia lido um livro de contos dele, "Risíveis amores". Ri (com ou sem trocadilho ridículo, tanto faz...). Foi então que avistei a garota ruiva. Ela bem sabe de minhas intenções(?). Um olhar insistentemente resoluto, ainda que sutil, creio, é bastante claro. Como não crer?
Ela se demorou, por um instante, ao me ver naquele lado do prédio. Éramos, apenas, eu e ela. Não sei se fixava os olhos, curiosos, na capa do livro que eu tinha em mãos, ou se, num susto, deparou-se estática ao ver aquele figurão inconveniente.
Seguiu ao banheiro. Voltei-me os olhos sobre o livro. Amanhã, evitarei demoras pelo corredor.